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CAMÕES (4) - ZaunköniG - 25.04.2010 CAMÕES I Tu quem és? Sou O século que passa. Quem somos nós? A multidão fremente. Que cantamos? A glória resplendente. De quem? De quem mais soube a força e a graça. Que cantou ele? A vossa mesma raça. De que modo? Na lira alta e potente. A quem amou? A sua forte gente. Que lhe deram? Penúria, ermo, desgraça. Nobremente sofreu? Como homem forte. Esta imensa oblação?... É-lhe devida. Paga?... Paga-lhe toda a adversa sorte. Chama-se a isto? A glória apetecida. Nós, que o cantamos?... Volvereis à morte. Ele, que é morto?... Vive a eterna vida. II Quando, transposta a lúgubre morada Dos castigos, ascende o florentino A região onde o clarão divino Enche de intensa luz a alma nublada, A saudosa Beatriz, a antiga amada, A mão lhe estende e guia o peregrino, E aquele olhar etéreo e cristalino Rompe agora da pálpebra sagrada. Tu que também o Purgatório andaste Tu que rompeste os círculos do Inferno, Camões, se o teu amor fugir deixaste, Ora o tens. como um guia alto e superno Que a Natércia da vida que choraste Chama-se Glória e tem o amor eterno. III Quando, torcendo a chave misteriosa Que os cancelos fechava do Oriente, O Gama abriu a nova terra ardente Aos olhos da companha valorosa, Talvez uma visão resplandecente Lhe amostrou no futuro a sonorosa Tuba. que cantaria a ação famosa Aos ouvidos da própria e estranha gente. E disse: "Se já noutra, antiga idade, Tróia bastou aos homens, ora quero Mostrar que é mais humana a humanidade. Pois não serás herói de um canto fero, Mas vencerás o tempo e a imensidade Na voz de outro moderno e brando Homero". IV Um dia, junto à foz de brando e amigo Rio de estranhas gentes habitado, Pelos mares aspérrimos levado, Salvaste o livro que viveu contigo. E esse que foi às ondas arrancado, Já livre agora do mortal perigo, Serve de arca imortal, de eterno abrigo, Não só a ti, mas ao teu berço amado. Assim, um homem só, naquele dia, Naquele escasso ponto do universo, Língua, história, nação, armas, poesia, Salva das frias mãos do tempo adverso. E tudo aquilo agora o desafia. E tão sublime preço cabe em verso. |